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Bonum est diffusivum sui

Educação clássica, a perda de tempo e a felicidade humana

Tiffany Schubert
The Imaginative Conservative

Quando eu era estudante universitária, saía para caminhar na área rural de Michigan. Ora sozinha, ora acompanhada. Caminhadas românticas, amigáveis, filosóficas, belas. Em uma delas, digna de nota, encantei-me com o amável efeito que a iluminação pública pode ter, à noite, nas folhas verdes. Perdi tempo nessas caminhadas, e isso moldou minha alma.

Essas caminhadas despretensiosas não acontecem com muita frequência numa sociedade moderna de ritmo acelerado e trabalho constante. Mesmo quando caminhamos, vamos rápido demais. Em entrevista à National Public Radio, Alan Lightman, físico e romancista, fez referência a um estudo do British Council da Universidade de Hertfordshire que estudou a velocidade das caminhadas; o estudo descobriu que durante 10 anos a velocidade média das caminhadas aumentou em 10%. 

Nossa pressa ao caminhar está relacionada com o ritmo acelerado do nosso mundo,o qual – sustenta o Dr. Lightman, em seu livro In praise of Wasting Time perdeu algo de essencial para o desenvolvimento humano, porque não promove o tempo livre. De acordo com Lightman, o mundo moderno, que ele chama de “mundo plugado”, é um mundo no qual cada momento está ocupado com projetos. Estamos trabalhando constantemente, e nossa avançada tecnologia nos permite fazer isso: “Levamos nossos smartphones e laptops conosco nas férias. Verificamos nossos e-mails nos restaurantes”. Tampouco nossas instituições de ensino superior são inocentes, afirma Lightman: “Nossa grade escolar está tão abarrotada, que os jovens não têm tempo para digerir e refletir sobre as matérias que supostamente estão aprendendo.” Estudantes estão tão ocupados com tarefas, que não têm a liberdade de contemplar a verdade e a beleza que encontram. É um mundo barulhento e tumultuado. 

É um mundo que representa uma ameaça ao desenvolvimento humano, particularmente para nosso desenvolvimento mental. Nesta mesma entrevista, Lightman declara que, numa sociedade capitalista, em que tempo é dinheiro, “não damos valor suficiente ao ócio, ao tempo para refletir, ao tempo para deixar a mente vagar, e penso que vai ser preciso demonstrar que há um grave problema de saúde mental enquanto fizermos isso.” Nosso vício em tecnologia também tem consequências para a saúde mental, como observa Lightman: “A depressão em adolescentes aumentou, desde a ascensão da internet”. A tecnologia nos possibilitou preencher cada momento com algum estímulo sensorial, e isso tem consequências nocivas para nosso bem-estar mental. Privamo-nos da “necessária regeneração mental que vem de não fazermos nada em particular”. 

Privamo-nos daquilo que Josef Pieper chama de ócio, aquela disposição receptiva à realidade, que torna possível a poesia e a filosofia. As almas ociosas são receptivas à beleza do mundo ao seu redor e cheias de curiosidade sobre suas causas. Esta receptividade é importante para a nossa saúde mental. Em nosso frenesi, estamos negligenciando o cultivo de uma riqueza interior que é parte de uma vida saudável e plena. 

Estamos em meio a uma crise de saúde mental, e nossa tecnologia, apesar de todos os seus benefícios, está contribuindo para isso

Lightman procura no setor de saúde uma solução para a cegueira da nossa sociedade em relação ao tempo livre: “Vai ser preciso demonstrar pelo setor da saúde, neste caso o setor da saúde psicológica, que estamos causando danos à nossa saúde mental, da mesma forma que chegamos a compreender o fato de que estamos causando danos a nossa saúde física com o tabagismo”. É uma analogia poderosa; tal como o tabagismo prejudica o corpo, o trabalho constante e o vício em tecnologia prejudicam a mente. O setor da saúde psicológica começou a examinar a relação entre tecnologia e a saúde mental. Um artigo recente na Clinical Psychology Science afirma que “adolescentes que passaram mais tempo em novas mídias (incluindo mídias sociais e dispositivos eletrônicos como smartphones) eram mais propensos a relatar problemas de saúde mental, e adolescentes que passavam mais tempo em atividades fora da tela (interação social pessoal, esportes/exercícios, lição de casa, mídia impressa e frequentar cerimônias religiosas) eram menos propensos.”

Estamos em meio a uma crise de saúde mental, e nossa tecnologia, apesar de todos os seus benefícios, está contribuindo para isso. Talvez o setor de saúde possa nos ajudar a ver o problema e soar o alarme — primeiros passos inestimáveis ​​—, mas ele não tem a profundidade filosófica para nos ajudar a resgatar o ócio.

A educação clássica, sim. Afinal, uma de suas metas é cultivar a riqueza interior, predispor o estudante a uma relação com o mundo que não seja meramente focada na produtividade. A pessoa bem educada tem uma rica vida interior, que a torna capaz de gastar bem o tempo livre: passá-lo contemplando a beleza de um soneto de Shakespeare ou meditando sobre um ensaio tomista. Esse tipo de contemplação revigora nossa mente e contribui para nossa felicidade. 

Como a educação clássica faz isso? Decerto, aqueles que estão em instituições dedicadas à educação clássica trabalham. Eles lêem e escrevem; têm tarefas e prazos; eles produzem. Mas todos esses assuntos estão a serviço do cultivo da alma, ao que John Henry Newman chama de “o hábito filosófico da mente” e Simone Weil chama de “atenção”. Weil declara que “o desenvolvimento da faculdade da atenção forma o real objeto e praticamente o único interesse dos estudos”. A educação clássica cultiva a atenção à realidade e um hábito mental receptivo às revelações da beleza e da verdade. Ela também desperta e alimenta o desejo por essa atenção interior. Os professores, portanto, têm um papel essencial em despertar esse desejo nos estudantes, nesse modelo. Essa educação se ocupa de maneira especial da felicidade humana, e proporciona aos alunos uma riqueza interior que é essencial para essa mesma felicidade que os convida a considerar.

Talvez isso tudo pareça um tanto sentimental ou ingênuo. Mas temos testemunhos da diferença extraordinária que uma alma bem-cultivada pode fazer nas circunstâncias mais sombrias. No livro Em busca de sentido, Viktor Frankl fala sobre como uma vida interior rica ajudou na sobrevivência de muitos no campo de concentração: “Pessoas sensíveis, que estavam acostumadas a uma rica vida intelectual, podem ter sofrido muita dor (frequentemente eram de constituição delicada), mas o dano interior nelas era menor. Elas eram capazes de refugiar-se de seu terrível ambiente numa vida de riqueza interior e liberdade espiritual”. Se uma alma assim proporciona proteção e enriquecimento mesmo em meio a tamanho horror, certamente pode fazê-lo em meio às provações cotidianas da vida. 

Dado o poder restaurador da educação clássica, aqueles que estão comprometidos com sua defesa têm uma grande oportunidade para persuadir os demais. Afinal, a boa retórica se apoia em algum bem compartilhado entre o retor e a sua audiência. E este bem é a saúde mental, uma saúde que vai além da mera libertação de neuroses, mas, antes, na obtenção de uma paz e uma riqueza interiores que nos libertem da tirania do frenesi moderno. Não estou recomendando a educação clássica como cura para todas as doenças mentais, como se a leitura de Shakespeare pudesse prevenir ou curar a esquizofrenia. No entanto, essa é uma leitura que pode nos ajudar a cultivar uma mente que sabe dispor bem do tempo, divagar e meditar sem uma agenda definida, uma mente que nem sempre está atenta às demandas do trabalho ou das mídias sociais. Os defensores da educação clássica podem se unir àqueles do setor de saúde que vêem uma crise na saúde mental e apresentar essa forma de educação, não como uma panaceia, mas como uma ferramenta essencial para o desenvolvimento da paz e da liberdade interiores. 

Esta defesa não reduz a educação clássica à utilidade – “faça uma educação abrangente e interdisciplinar porque vai ajudá-lo a se sentir menos ansioso”. Em vez disso, ela aponta para o papel que a educação desempenha na felicidade humana. Os seres humanos não são meramente produtores; eles também são amantes da beleza e contempladores da verdade; eles “perdem” tempo. 

As pessoas educadas na escola clássica não têm uma agenda quando caminham. Elas simplesmente caminham, mantém os olhos bem abertos e o espírito vivo. 

Tiffany Schubert ensina no Trivium and Humanities Tracks no Wyoming Catholic College. Ela obteve seu Ph.D. em literatura pela Universidade de Dallas em 2016, onde lecionou literatura por vários anos.

The Imaginative Conservative, todos os direitos reservados. Publicado com permissão. Link original: “Liberal Education, the Wasting of Time, & Human Happiness”.

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