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Bonum est diffusivum sui

O que é uma nação?

Samuel Stone
The Imaginative Conservative

Que certas palavras e frases sejam esvaziadas é algo que acontece com frequência nas sociedades. Essa perda de significado costuma acontecer de duas formas.

A primeira é quando uma sociedade costuma usar uma palavra de tantas formas diferentes que ela se torna um ruído inútil. Quando uma palavra é utilizada para descrever tudo, acaba não definindo nada. No mundo atual, isso pode ser visto em palavras como “racista”, “radical” e “fascista”. Cada uma delas foi usada contra tantas pessoas inocentes que qualquer significado que elas pudessem ter foi perdido.

A outra forma é menos óbvia: quando a sociedade parece concordar com o significado da palavra e, sendo assim, não mais a examina. Se isso acontece por muito tempo, o significado se perde e tudo o que resta são exemplos da coisa. Alguém pode ser capaz de apontar para essa coisa, mas ele raramente é capaz de definir suas características essenciais. Um exemplo disso, na sociedade moderna, é a palavra nação.

Raramente se discute a questão sobre o que verdadeiramente constitui uma nação. No entanto, compreendê-la é imperativo para a preservação da sociedade política, pois não se pode sustentar por muito tempo algo que é mal entendido. Felizmente, Os Artigos Federalistas[1] proveem uma boa compreensão sobre as características essenciais das nações.

Cada nação expressa as características que lhe são próprias de uma forma levemente diferente, mas todas elas possuem essas características. É possível examinar cada nação e descobrir o que é necessário para que ela seja considerada como tal. O exemplo mais claro é o fato de que cada nação é composta por diferentes extensões de terra. É impossível que dois países existam no mesmo território. Isso está ligado, de diversas maneiras, ao direito e ao governo. Apenas um povo pode reivindicar o direito de governar uma extensão de terra em particular.

Se esta fosse considerada comum e nenhum povo pudesse ter direito a ela, então não seria o ente específico conhecido como nação, mas outra coisa. Em outras palavras, a terra não pode ser possuída de forma comum e privada, da mesma forma e ao mesmo tempo. Sabendo desse fato, John Jay comemora a nítida localização geográfica dos Estados Unidos. Jay vai além e menciona como o território está conectado e não “composto de territórios distantes e separados”.

A fim de proteger essas porções de terra em particular, um país deve ter fronteiras. Se alguém removesse essas fronteiras, então a nação seria uma terra comum à qual todos têm direito. Como foi mostrado, isso não é possível. Em decorrência disso, está claro que uma nação não pode ser distinta e comum ao mesmo tempo.

Por mais importante que seja a distinção de uma certa área de terra, a distinção do povo que forma a nação é mais importante. Escreve Jay, “Com igual prazer, frequentemente percebi que a Providência ficou contente em dar esse país unido a um povo unido.” Jay explicita todas as formas pelas quais o povo americano é distinto de outros povos no mundo.

A parte principal de sua distinção é a história compartilhada do povo americano, especialmente em relação à Guerra de Independência. Em outras palavras, esse povo em particular tem uma história compartilhada que os mantêm unidos para formar uma nação. Eles têm uma experiência comum e navegam juntos pelos eventos no esforço para realizar um bem.

Outra característica de um povo unido é a tradição. As tradições são aquelas crenças e práticas que um povo passa adiante de geração em geração. De alguma forma, elas são similares à história do povo na medida em que ajudam a contar a sua história. Uma nação sem qualquer laço histórico ou tradicional entre seu povo teria dificuldade em uni-lo em um esforço comum; a experiência compartilhada fomenta a boa vontade e a cooperação; as pessoas tendem a confiar e amar mais prontamente aquilo com estão familiarizadas. Os laços históricos e da tradição são, portanto, dois dos mais poderosos auxílios da coesão social.

Além dessa história compartilhada, o povo americano, conforme descrito por Jay, tem uma cultura compartilhada. Muitos americanos vieram de origens muito semelhantes; a maioria deles eram protestantes ingleses. Jay os descreve como um “povo descendente dos mesmos ancestrais, falando a mesma língua, professando a mesma religião”. Ele continua a explicar que eles têm muitos costumes semelhantes, não apenas vivendo perto um do outro, mas, mais importante que isso, com laços culturais que os unem. Esses são os laços comunitários que tornam possível a convivência e a busca pelo bem comum.

É importante notar que o povo descrito por Jay é um ente distinto de qualquer outro povo na terra e isso mostra como o povo de uma nação não pode simplesmente ser substituído. De forma muito parecida com o solo que eles habitam, eles são um grupo próprio que pode ser facilmente distinguido por todos os homens sensatos de um outro grupo. Eles têm suas próprias tradições e modos de viver, que podem se assemelhar com outros de alguma forma, mas em última instância são próprios. Isso não quer dizer que ninguém pode se juntar a esse grupo.

Significa, entretanto, que seria necessário, para se juntar a um grupo diferente, adotar a sua cultura de muitas maneiras. Uma pessoa não pode simultaneamente se juntar a um grupo distinto de pessoas enquanto ele mesmo se distingue. Isso não quer dizer que todos agirão de maneira completamente uniforme, mas todos os indivíduos compartilharão certas características e crenças essenciais.

Estas crenças talvez sejam a parte mais importante da cultura. São os princípios anímicos [da alma] que conduzem a sociedade. Jay os chama de “princípios de governo”, e é imperativo que a maioria das pessoas estejam de acordo sobre esses princípios. Para os norte-americanos, a Guerra da Revolução Americana, que constitui uma parte essencial de sua história comum, foi travada a fim de defender esses princípios de governo.

Esses princípios estão expressos de maneira mais excelente no magnífico preâmbulo da Declaração de Independência dos EUA. Este é o fundamento do governo dos Estados Unidos com o qual a maioria dos americanos concordaria. Esses princípios anímicos foram usados para compor a lei conhecida como Northwest Ordinance, que garantiu muitos dos direitos que os americanos prezam. Eles também incluem o governo representativo, a segurança das pessoas e das propriedades, e a abolição da escravidão. Eles permitiram, apesar das lutas políticas, um senso de unidade e pertencimento.

O mais claro desses princípios anímicos é a justiça. De muitas formas, ela é a força anímica por traz da sociedade política. Conforme James Madison explica no Federalista 51, “A justiça é a finalidade do governo. É a finalidade da sociedade civil.” Ele continua explicando que a sociedade continuará a buscar a justiça até que ela seja alcançada ou a liberdade seja perdida. As palavras de Madison ilustram o imenso poder que possui a visão de justiça de uma nação. Ela dá uma direção à sociedade e serve de base para todas as suas leis.

Deste modo, quando uma sociedade não possui mais uma visão comum de justiça, ela inevitavelmente se divide em facções. A sociedade é puxada em duas direções diferentes e, em algum momento, algo tem de ceder. Como explica Jesus, “Se um reino está dividido contra si mesmo, esse reino não pode subsistir”. O que une as partes integrantes de uma sociedade unida é um acordo sobre o significado de justiça.

Está claro que uma nação é um ente complexo. Ela tem características que são tanto físicas como de natureza espiritual. Todas as suas partes são essenciais para a felicidade da nação e, como tais, devem ser protegidas. A invasão em uma de suas áreas é um ataque ao conjunto, e se alguma cair, não demorará muito para que toda a nação deixe de existir e algo novo surja em seu lugar.


Samuel Stone está cursando o mestrado no St. John’s College e formou-se em Política no Hillsdale College.

The Imaginative Conservative, todos os direitos reservados. Publicado com permissão. Link original: “What Is a Nation?”.


[1] Textos sobre as reformas necessárias à nascente Constituição dos Estados Unidos, publicados conjuntamente por Alexander Hamilton, James Madison e John Jay.

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